quarta-feira, 8 de setembro de 2021
sábado, 24 de abril de 2021
O SEGREDO POR TRÁS DO SEGREDO
O livro de Rhonda Byrne, O Segredo, foi lançado em 2006 e causou imensa repercussão prometendo mudar vidas e trazer prosperidade em todos os sentidos para todos os que se propusessem a seguir os ensinamentos lá expressos.
Contudo, não foi bem assim que aconteceu de fato para a grande maioria das pessoas. Óbvio que teve muitos casos de sucesso, mas se alguém, digamos cheio de problemas, vendo-se em dificuldades diversas, sobretudo financeira, pegar a ler e estudar o livro (ou o vídeo) provavelmente terá pouco sucesso, pois o livro é, de fato, somente a abertura de uma porta para uma saída que terá que ser trilhada com muita determinação. Isto frustra e anula a força de vontade (item básico para o sucesso seja em que campo for).
O livro mostra os caminhos, mas não diz com clareza como trilhá-lo.
A obra que inspirou Byrne foi “A ciência para ficar rico”, de Wallace D. Wattles, lançada em 1910.
Foi este o livro que ela ganhou da filha quando estava em dificuldades que mudou sua vida e a inspirou a fazer, a princípio o vídeo e, posteriormente, o livro. “O Segredo” fala dos princípios básicos da lei da atração, mas não dá as chaves para abrir as portas: Fé, visualização, sentimentos, gratidão, poder, etc.
Mas, se focarmos somente na Fé como exemplo, vemos que este não é um tema novo, aliás, o maior poder que um Ser Humano pode adquirir, é recorrente no mundo desde sempre.
Quantas pessoas já debruçaram sobre os joelhos em oração? Em qualquer igreja vê-se em todas as pessoas as expressões mais genuínas em busca desta força; vê-se pessoas convictas que a possuem; sobretudo os líderes religiosas, que são reconhecidos por este status.
Mas, por que entre os milhões de leitores do livro, assim como os milhões, talvez bilhões de crentes ao redor do mundo não se vê demonstração de Fé realmente verdadeira, aquela capaz de mover montanhas? Vê-se tão somente discursos e falácias sobre esta; vê-se pessoas jurando possuí-la, mas seus resultados na vida não demonstram isto.
Porque a fé é vista quase sempre em um lado místico e até mesmo subjetivo e não um ente que se pode dizer científico e lógico.
Assim quando John Assaraf diz no livro “O Segredo”
Nós podemos ter qualquer coisa que escolhermos. Não me importo com o tamanho do desafio. Em que tipo de casa você quer morar? Quer ser milionário? Que tipo de negócio quer ter? Quer mais sucesso? O que você realmente quer?
Discurso assim não muda as coisas. Apenas mostra o que se é possível conquistar. Assim é o livro todo. Acaba se tornando uma espécie de manual do que se pode ter no catálogo do Universo. Como dito na metáfora de James Ray que diz:
“Pense em Aladim e sua lâmpada: ele pega a lâmpada, esfrega-a, e de dentro dela sai um Gênio que sempre diz uma única coisa:”
“Seu desejo é para mim uma ordem!”
Em “O Segredo” o gênio seria o Universo que faz as vontades de Aladim, papel que pode ser vivido por qualquer um na vida real.
Então por que funcionou para Rhonda Byrne e para tantas outras pessoas?
Porque estas pessoas foram e vão além dos discursos teóricos e metafóricos. E seguem buscando a plenitude e não partes. Porque eles fizeram e fazem as coisas de uma certa maneira, como diz o princípio básico de Wattles em “A ciência para ficar rico”.
Diferentemente do que acontecem com os demais pretensos crentes, para o sentimento de manifestação de Fé dos religiosos uma explicação vem fácil por não terem verdadeiro potencial a lhes trazer o que querem ou necessitam, sejam riquezas materiais, saúde ou outras coisas que desejam. Isto se dá porque quase sempre sua pseudo-fé vem naufragada em medos, principalmente no medo de pecar por desejar alguma coisa; estar sendo ávaro ou soberbo; vaidoso ou orgulhoso. Enfim, como se faz crer nos cultos religiosos: Não é fácil para os ricos entrarem no Reino do Céu. O problema é que não existe Fé pela metade. Assim, ou se é pleno ou não se é nada. Fé e medo são antagônicos.
Em “A Ciência para ficar rico”, livro que se pode ler em poucas horas (mas estudado sempre) Wattles é bem explícito em relação com sua visão sobre a Fé religiosa: ele a usa em seu pleno potencial e é bem claro em várias passagens do livro sobre sua inspiração em Deus e em passagens do Evangelho; para ele a Fé religiosa não é contrária da que se busca para as conquistas pessoais e afirma em certa passagem:
“Livre-se da ideia que Deus quer que você se sacrifique pelos outros e se glorifique com isso. Deus não requer nada deste tipo. O que Deus quer é que você dê o melhor de si, por você mesmo, e pelos outros. E você pode ajudar mais os outros fazendo isso do que de outro modo.
Você só poderá dar tudo de si ficando rico, portanto é certo e louvável que você deva priorizar seu pensamento no trabalho de adquirir riqueza.”
Assim ele vem em contrário à resignação dos crentes. Ora! Serve-se melhor a um propósito estando preparado. Não consigo crer que por simplesmente uma pessoa ser rica (em termos financeiros e materiais) já estará privada do Reino dos Céus; assim também não é possível crer que a pobreza garanta a alguém a certeza de estar a direita do Pai no dia do Juízo.
O que se vê de fato é misticismo em cima de misticismo.
O autor segue em sua obra de forma pragmática e diz pensamentos como:
“A posse do dinheiro e da propriedade vem em consequência de fazer coisas de certa maneira, e aqueles que fazem as coisas desta certa maneira – intencional ou acidentalmente – enriquecem, enquanto aqueles que não fazem desta certa maneira – não importam quão duramente trabalham ou o quanto são capazes – permanecem pobre.”
Em verdade o livro “O Segredo” foi um comentário ao livro de Wattles, pois a obra de Byrne tem uma suavidade se comparada a tenacidade empregada em “A Ciência para ficar rico”. Wattles pode até assustar alguns em certos conceitos, sobretudo quando fala sobre a relação com a pobreza.
Se a obra do século XXI foi inspiradora, mas talvez não suficiente para a grande maioria de seus leitores, a obra do século anterior ainda é muito impactante, e porque não dizer desafiadora, pois o autor afirma convicto que quem seguir o ensinado no livro certamente ficará rico, pois se seguirá uma ciência.
Fato curioso é que o autor anterior é mais profundo nos temas abordados.
Se a Fé, a maior potência humana foi enaltecida em “O Segredo”, no livro “Pense e enriqueça” de Napoleon Hill, outro autor do século XX, ela foi explicada e ensinada como adquiri-la em um capítulo com quase vinte páginas.
Diz Hill, logo no início do segundo capítulo (Fé): Como desenvolver a Fé
"A Fé é um estado de espírito que pode ser induzido ou criado pela afirmação ou repetição de instruções ao subconsciente, empregando-se o princípio da autossugestão."
O autor deu vários exemplos de Fé e criou exercícios para o desenvolvimento desta através da autossugestão.
Mas tanto pelo que é expresso em “O Segredo” ou nas obras de Wattles e Napoleon Hill a conquista do sucesso vem de três princípios básicos:
Desejo (tem-se que saber o que quer), Fé (uma inabalável que leva a obstinação) e trabalho (sobretudo o mental: imaginação, concentração, convicção, decisão, persistência, etc.).
Para fechar esta reflexão vou buscar o inspirado orador, Earl Nightingale, que afirmou: Nós nos tornamos aquilo em que pensamos.
quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021
DA NATUREZA DAS LEIS DIVINAS
COMENTÁRIO AO TEXTO DO LIVRO "AS LEIS" DE MARCO TÚLIO CÍCERO
Quinto: - Penso como tu, meu irmão, que o justo e verdadeiro é
também eterno e que não nasce nem morre com a letra e as decisões legais.
Marco: - Logo, assim como a mente divina é a lei quando atinge no homem
seu mais completo desenvolvimento; mas este desenvolvimento só se encontra
na mente do sábio. (Cícero, das Leis, I – II , pp 64-65)
Em que consiste a lei?
Cada um fazer o que lhe cabe.[1]
Princípio estabelecido por Platão em A República que traz um caráter intrínseco de justiça que de certa forma coloca cada individuo como artífice da lei. Cícero, como estudioso do mestre de Atenas irá segui-lo nesta trajetória para estabelecer os fundamentos do Direito.
Dará às Leis status de divinas, ao menos as leis soberanas, as verdadeiras as que não se alteram com o tempo, pois são eternas; não se alteram com as tradições ou vontades humanas, pois são vindas da suprema natureza que ordena o que se deve fazer e proíbe o contrário[2], são vindas do próprio deus; são as Leis que pertence a todos os séculos e já era vigente quando não havia lei escrita nem Estado constituído.
Inspirado na mente divina, nesta Razão, o homem, entenda-se aqui o sábio, tem de desenvolver e transformar em leis para a sociedade estes princípios naturais, onde fará prevalecer as boas ações e vetar as más, enfim: dar a cada um o que é seu[3]. Quanto a esta Natureza Divina, Cícero afirmará em Dos Deveres que esta ...
... colocou em todo o ser vivo a aptidão inata de conservação, para defender seu
corpo e sua vida, para evitar o que danifica, para procurar todo o necessário com
que viver, o alimento, o abrigo e outras coisas dessa espécie[4].
Vindo de sua origem estas necessidades, a de conservar através das aptidões inatas segue o homem pelos caminhos que lhe cabe, ou pensa que lhe cabe, esquecendo seu princípio mais fundamental: a alma, fonte do que há de mais divino seja na terra ou no céu; a razão, que está tanto no homem, quanto em Deus, vínculo primeiro entre criador e criatura.
Para se definir o que é Direito, Cícero, irá buscar a lei suprema que foi inspirada pelo deus; enfim, é a Apolo, deus de Delfos, que compete estabelecer as leis mais importantes, as mais belas e as primeiras entre todas[5]. E das leis primeiras do deus está o conhecer-se a si mesmo, que é de fato conhecer todos os dons e dádivas dadas a nós pelos deuses ao nascermos, além de nos dar a oportunidade de alcançarmos a sabedoria. E vem da sabedoria o caminho para a Razão que será lei quando atingir no homem seu mais completo desenvolvimento, assim como a lei suprema é da mente divina[6].
Para Cícero, é a razão o que conduz à sabedoria, esta quando desenvolvida e aperfeiçoada
E esta razão deve ser justa por ser em comum, só assim há sentido. Daí resulta que também há lei. Logo, lei também é outro vínculo entre homens e deus, por conseguinte do direito[7].
De fato será o Direito verdadeiro o que pode ser colocado ante o homem em que qualquer tempo, pois estará ligado a deus pelo vínculo da lei que vem da razão justa. É esta razão que diz que o estupro sempre será ato que atenta contra a justiça suprema, mesmo que a lei civil seja tolerante em certa época ou circunstância. Um ato criminoso irá separar o homem do homem e não o deixará dialogar e viver em comum[8].
DA NATUREZA DAS LEIS HUMANAS
... mas, tamanha é a corrupção proveniente dos maus costumes, que
destrói o que poderíamos chamar de lampejos que nos foram dados
pela Natureza, fomentando e reforçando os vícios contrários[9].
Longe de ser virtuosas, as leis que não se inspiram na alma, na razão vinculado ao deus, serão leis de seu próprio tempo, adequadas aos espíritos de uma certa época, mas que serão revogadas por interesses outros, ou até por uma lei que venha da razão justa. Ou atos que não sejam em dado momento questionado se são bons ou não, podem ser visto com olhos de retidão e considerados contra a sociedade; atos que coloquem o homem contra o homem, mas que a lei civil não condena, como exemplo, o duelo.
Esta corrupção proveniente de maus costumes destrói o que poderíamos chamar de lampejos que nos foram dados pela Natureza, fomentando e reforçando os vícios[10].
De certo modo, pessoas assim são muito engraçadas... Como
mencionávamos há pouco, elas estão sempre fazendo
leis e emendando-as, sempre pensando que descobrirão como
impor um limite às fraudes nos contratos e, a respeito do que eu
estava falando agora, ignorando que, na realidade, estão
como que tentando cortar a cabeça da Hidra[11].
Oras! É o que se faz quando se quer ignorar as leis dos deuses: criar leis, revogar, emendar, revogar. Sempre haverá uma cabeça para ser cortada, mas sempre haverá outra a crescer. Cícero quer fazer ver que estas leis de certa forma devoram-se a si mesma quando destroem os lampejos dados pela Natureza
Embora a natureza tenha dotado o homem com aptidão inata de conservação, acima de tudo o dotou com alma, com a razão que o coloca acima de todos os outros seres, e, portanto, tem de prevalecer a justiça suprema acima da humana.
COMENTÁRIO FINAL
Filho da Natureza suprema, do Deus universal o homem recebeu o
dom divino da alma (tem sua força em Deus), mas os demais atributos, que
pertencem à categoria das coisas mortais, são frágeis e efêmeros[12].
Vivendo a ambiguidade de Ser imortal, como alma, e mortal em sua matéria o homem tem de buscar a razão em meio a sua subsistência. Nesta busca encontra somente
na lei que é a razão suprema da Natureza, que ordena
o que se deve fazer e proíbe o contrário[13].
Ainda, diz Cícero, que todos os povos sentem-se obrigados a crer em deus, mesmo que ignore este ente[14]. É nesta crença inata em um ser superior, por parte do homem em que o autor se baseia para formular sua filosofia, além, óbvio, de sua percepção em uma ordem superior, que conduz a alma humana a busca do bem. Daí segue em busca das Leis que conduzirão a sociedade.
É nesta lei, fundamentada na razão divina que embasa sua teoria sobre o Direito justo, enfim
temos então um parentesco com os seres celestiais[15].
É neste entendimento que fundamenta sua busca pela justiça: somos vinculados com o deus pela justa razão e pela lei e também por de certa forma termos intrínseco em nós a sociabilidade, que não podemos nem alegar que seja uma virtude[16].
Assim existe só um direito, aquele que constitui o vínculo
da Sociedade humana e que nasce de uma só Lei; e esta Lei
é acertada em tudo que ordena e proíbe. Quem a ignora
é injusto, esteja ela escrita ou não em alguma parte[17].
A mais verdadeira Lei, a da Natureza, a que vem do deus de Delfos. Esta é perene: o agressor de ontem não alcançado pela lei civil é criminoso pela Lei da Razão. Se não se pode puni-lo hoje, mas se já se reconhece como tal um ato como natureza criminosa, institui-se uma nova lei e torna este ato proibido por ser uma ação má e, portanto, passível de punição e de desonra. Mas, que esta lei seja embasada na razão e não mais uma cabeça de Hidra.
E não se pode desconsiderar que
Nascemos para a justiça e o que o direito não se baseia
em convenções, mas sim na Natureza[18].
Bibliografia
Cícero, M. Túlio, Das Leis – Trad. Otávio T. de Brito – Clássico Cultrix
Cícero, M. Túlio, Dos Deveres – Trad. Alex Marins – Martin Claret
Cícero, M. Túlio, Da República – Trad.Amador Cisneiros – Edipro
Platão, A República – Trad. Anna Lia Amaral de Almeida Prado – Martins Fontes
[1] Platão, A República
[2] Cícero, das Leis, I – I , p 40
[3] Idem
[4]Cícero, dos Deveres, I – VI
[5] A República (427 b) - Platão
[6]Cícero, das Leis, I – II , p 65
[7] Cícero, das Leis, I – I , p 41
[8] Cícero, dos Deveres, I – IV
[9] Cícero, das Leis, I – I , p 46
[10] Cícero, das Leis, I – I , p 40
[11] Platão, A República (426 e)
[12] Cícero, das Leis, I – I , p 43
[13] Cícero, das Leis, I – I , p 40
[14] Cícero, das Leis, I – I , p 43
[15] Idem
[16] Cícero, da República, I – XXVI)
[17] D Cícero, das Leis, I – I , p 48
[18] Cícero, das Leis, I – I , p 44)
(AEM, 2010)
