segunda-feira, 22 de abril de 2013

UM CONTO DE RÉIS


Ainda moço, nos longínquos idos de trinta, o Vicente (Centinho, desde bebê), caboclo esperto, bão de prosa (como se dizia na época; assim contou meu pai) resolveu vender a Bandolera, uma vaquinha muito boa de leite, diziam a melhor da região. 
Não faltaram interessados na vaca da Dona Luzia (a verdadeira dona, consorte do Seu Centinho). Entres estes estava o Coroné Migué, o maior fazendeiro local, que foi até às terras dos donos da primorosa.
- Dia, Coroné!
- Dia, Seu Centinho!
- Que bãos vento troxe o coroné pra minha umirde terra?
- Tô sabeno que o senhor qué vendê a vaca da Dona Luzia. É verdade?
- É sim, coroné.
- Quanto o amigo qué pela Bordadera?
BORDADERA? O coroné RESPEITE minha muié.
- Discurpa home, mas num tô falano da sua muié. Tô falano na vaca da sua muié. Ela num chama Bordadera?
NÃO! O coroné é home valente, sei disso, mais eu num vô dexá o sinhô falá mar de minha Luzia! Minha Luzia bordadera!
- Discurpa, Seu Centinho, ma ...
- NUM CARECE SE DISCURPÁ! É mió o coroné issimbora de minha terra. Num vendo minha Bandolera pro coroné, nem por todo dinhero desse mundo.
- Discurpa, home. Foi um mar intendido. Pensei que a vaca chamava Bordadera.
- O CORONÉ TÁ DE BRINCADERA COMIGO?
- NUM TÔ NÃO, HOME! SÔ HOME DE RESPEITO I U CUMPADI DEVE SABÊ DISSO!
- Discurpa coroné, mais ...
- MAIS O QUÊ?
- Vamô mudá o rumo dessa prosa coroné!
-É mió memo, Seu Centinho.
- Mais ..., memo assim não tem negócio com o coroné.
- PRA NUM FICÁ DÚVIDA DÔ UM CONTO NA BANDOLERA!
- Bheinn! Nesse caso que o coroné tá mostrano que é home de horna, eu num posso dexá de dá valô pra isso; eu vendo!
Fez-se o negócio. O coronel, feliz da vida, levou a Bandolera para a Fazenda Monte Verde.
O Seu Centinho pegou o dinheiro e correu para casa. Tinha de falar com a mulher; e era urgente.
- LUZIA! LUZIA! LUZIA!

Mais o que tá aconteceno home pro cê ficá nesse berrero todo?
Muié, vai pra casa da sua mãe; e vai logo quo cê tem que aprendê bordá! 

(AEM, 2011)

Nenhum comentário:

Postar um comentário