domingo, 19 de julho de 2020

SOLITÁRIA EDUCAÇÃO SOLIDÁRIA


Vou a um tempo e lugar em que não vivi e vivo por um instante o pensamento de uma gente: estudar para quê? Estudar não enche barriga.
Café, arroz, feijão. Gado às vezes. Eram os trabalhos dos homens.
Café, arroz, feijão. Carne às vezes. Eram os trabalhos das mulheres.
Minha mãe conta as dificuldades de um tempo contra o conhecimento. De um tempo e povo escravo do agora. Sobreviver é preciso, conhecer não é preciso; a não ser aquilo que o instante obriga. Enfim, os calos sabem o que e como fazer.
Daqueles dias insólitos, salto para o agora e vejo a antítese daquele tempo, onde tudo gira e fala em conhecer, criar, recriar, aprender, inovar, reciclar. Um salto de anos que parece de séculos. Será?
Será que ainda o país ainda não está escravo do momento? Se o chamado centro-sul já fala em tempos novos o norte-nordeste ainda vive à sorte da natureza. Café, arroz, feijão ... às vezes. Conhecimento, educação? Oras, oras.
Fala-se muito. Uns poucos vivem o muito. O resto, todavia, fica com o resto.
Quando se espera uma reviravolta, pois se diz que se tem uma porcentagem de crianças e adolescentes nas escolas vem um sistema de ensino cada vez mais deteriorado. Isto, talvez, seja uma evolução. Transforma-se um país de analfabetos em país de semi-analfabetos. Para breve a próxima etapa. Quem sabe este século veja o epílogo desta comédia.
Quando se espera igualdade de bases vem uma equação de cotas para minorias. Uma forma de se esconder a própria incompetência em dar base sólida. Daí, quando se vê que a casa vai ruir improvisa-se uma escora. Pudera, escora-se de tudo por aqui. É para isto que servem as verbas.
As verbas deveriam ser para equacionar planejamentos, mas o que sobra do mau uso vai para escoras mesmos.
Então, esqueça-se o poder público.
Mas, há um poder privado capaz de suprir a ausência estatal? A sociedade pode fazer o que deveria ser feita pelos impostos? Sim?
Então, seja então imposto mais este labor.
É sempre assim mesmo. Sempre temos de pagar em dobro pelos chamados direitos básicos constitucionais. E por todos os outros também.
De fato, de todo este emaranhado, o que sobra é uma enorme boa vontade de gente que quer se fazer por si mesmo, pois sabe que somente consigo mesmo pode contar. (Há um quê de abandono no ar. Respira-se como e quando se pode.)
Possivelmente um mundo em reação buscando renovação que Darwin definiria melhor que Freud ou Betinho seja a mola que venha impulsionar as bases de pessoas comuns; pessoas reais. Pessoas que não têm o Estado e nem organizações sociais que lhes dê amparo. Pessoas que agradecem por terem um emprego, ou agradecem pelo emprego dos arrimos; empregos, quase sempre, de meses longos e apertados. Creio que todas soluções estejam nelas, pois antes de tudo são a verdadeira força. É o país que luta e vence. E o país que anda a passos pesados, mas caminha; e caminha sorrindo. É o país que quer ver todos em caminho de vida, de luz, pois conhece muito bem o caminho dos espinhos e das armadilhas nas pontes que se tem para atravessar.
E para toda caminhada há de haver o primeiro passo. Passo este que já está dado nas organizações sociais que com voluntários tentam fazer aquilo que a política imediatista não faz por ser cultura e educação muito caras; tecnologia então ... nem ouso mencionar.
Enfim, sobreviver é preciso, dar conhecimento não é preciso. Aliás, dar conhecimento é desnecessário; inoportuno.
Então, que venha de baixo a nova ordem! Pela primeira vez em nossa história uma revolução vinda de baixo?
Uma revolução silenciosa; sem líderes; sem discussões estéreis; sem culpas. É o que se vê por todo lado: no sertanejo que ensina música sob as sombras das árvores; nos cursos preparatórios na periferia dos grandes centros; na arte das ruas; nas empresas que alfabetizam; na pessoa comum que oferece o que tem de si para muitos que, quando muito, tem somente esperanças.
Eis a nova ordem; a nova revolução: revolução do Homem pelo Homem.
Uma revolução de gente, de vida, de conhecimento ... e silenciosa ... em um tempo ainda contra a lógica e a razão, embora tente dizer e mostrar o contrário.

(AEM, 2006)

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