Sempre que vejo um fila de formiguinhas
no árduo trabalho do instinto, paro e perco-me na mais pura abstração. Fico
olhando as criaturinhas a correr como se sobre trilhos. Antes, por pura
curiosidade passava alguma coisa, como palito, prego, agulha, sobre o caminho e
elas paravam como seu eu houvesse aberto uma cratera em sua rota, ou paravam
como se batessem em uma parede; sem ter como prosseguir, voltavam pelo caminho
demarcado.
Engraçado quando se
encontram nas idas e vindas, acho que até “batem cabeça”, daí desviam e cada
uma segue o próprio destino cego sem, contudo, descarrilar.
Se livre de qualquer vontade ou desejo de fazer algo, ou, se não houver deveres clamando por mim, posso passar até minutos olhando a monótona e cansativa vida destes pequenos seres.
Se livre de qualquer vontade ou desejo de fazer algo, ou, se não houver deveres clamando por mim, posso passar até minutos olhando a monótona e cansativa vida destes pequenos seres.
Entro, como em um vazio mental; uma quase terapia.
Quando volto aos raciocínios viajo em
analogias sobre as vidas das formigas e as humanas.
E não é preciso viajar muito para perceber que há muito de formiga no Homem. Somos bem mais que somente instintos, porém, ainda dominados por estes. Parece que o que mais fazemos é satisfazer ou descobrir meios mais eficazes e prazerosos de nos satisfazermos em nossos desejos mais imediatos, mais animalescos. Diferimos das formigas neste aspecto: encontramos prazer nos instintos.
E não é preciso viajar muito para perceber que há muito de formiga no Homem. Somos bem mais que somente instintos, porém, ainda dominados por estes. Parece que o que mais fazemos é satisfazer ou descobrir meios mais eficazes e prazerosos de nos satisfazermos em nossos desejos mais imediatos, mais animalescos. Diferimos das formigas neste aspecto: encontramos prazer nos instintos.
Não que seja mal a busca do prazer, muito
pelo contrário, é uma necessidade básica; a busca do prazer nos instintos é
quase um outro instinto de preservação, e nem estou falando de sexo.
Até parece que corremos nos dias e noites
rumo a uma forma de perpetuar os prazeres, ou de busca-los (nem aí falo somente
em sexo). Chamamos, quase sempre, de busca da felicidade. Um disfarce nobre
para nossos instintos.
Não faço estas reflexões por mera crítica
ao Ser Humano, nem mesmo como autocrítica, que, confesso, se referente a mim
seria bem justa, até porque é bom o prazer, muito bom mesmo; maravilhoso; e nem
aqui estou somente falando de sexo.
Deixando o lado instinto, antes que eu
realmente comece a falar em sexo e descambe para onde não é meu interesse neste
texto, parto para o que realmente busco nestas reflexões que é traçar um
paralelo entre homens comuns e as formigas e Bruno; Giordano Bruno. Tento
deixar os instintos em busca da inteligência e intuição.
Usarei este ícone da Humanidade, sem
maiores pretensões, pois conheço e reconheço minha pequenez e parca capacidade
intelectual, ainda mais ante este gigante.
E o usarei por ter assistido esta semana um filme biográfico sobre ele.
E o usarei por ter assistido esta semana um filme biográfico sobre ele.
Começo pelo fim do filme, ou seja, começo pela fogueira. Começo pelo
fogo que tinha a intenção de salva-lo do inferno pelas blasfêmias e heresias
que cometeu em escrever e falar contra a verdade secular.
As chamas devoraram um corpo, mas é certo
não devoraram o Espírito, a essência; a mesma essência que ele defendeu até o
martírio. Não temeu o julgamento. Tão somente, encenou uma abjuração no
primeiro julgamento por considerar que vivo poderia agir e divulgar seus
pensamentos e lançar um pouco mais de luz sobre as trevas.
Este mártir do livre pensamento viajou
como andarilho por toda Europa, levando sua lógica, razão e princípios; foi
recebido em todas as cortes ditas civilizadas da época e deixou suas marcas.
Falou daquilo que via como lógico e questionou pensamentos, principalmente
teológicos, que considerava equivocado. Mas, o que soava inconsistente para sua
razão lúcida e livre, para os tribunais da Inquisição era a verdade máxima.
E a Santa Inquisição tentou condenar pensamentos livres na figura da carne. Quão vã tentativa.
E a Santa Inquisição tentou condenar pensamentos livres na figura da carne. Quão vã tentativa.
Mesmo que se condenem milhares de homens, milhões, a Verdade sempre será intocada. Nenhum tribunal do mundo foi e é capaz de revogar Leis Eternas. Bruno foi para a fogueira e suas obras condenadas ao mesmo destino. Deu-se, naqueles dias uma aparente vitória da Eclésia.
E nos dias de hoje, o que há de doutrinas
e de fé? O que ainda ficou das passagens de Bruno, passados mais de
quatrocentos anos?
Talvez, o que de pior ainda sobra do
século do mártir do livre pensamento, seja a massa que ainda é como de
formigas. Se, por força das provas incontestáveis a Terra deixou de ser centro
do Universo, a velha carcaça de carne e sangue ainda persiste em ser o centro
da vida.
Não são muitos os que conseguem realmente vislumbrar os infinitos no tempo e no espaço. Não é lugar comum buscar os fatos e as possibilidades sem uma antevisão que descaracterize o novo, aliás, o eterno, de forma que não deforme pelos conceitos amarrados em velhos pacotes já prontos e mofos. Prontos e feitos por homens com tochas à mão. Mofos por estarem aprisionados em celas filosóficas medievais.
Vivemos atualmente em um mundo livre para
o pensamento. Através dos milênios tanto se ambicionou, tanto se lutou por este
livre pensar, para hoje nos prendermos nos instintos, no agora, no metro
quadrado que em pisamos? Tanto se lutou para nos deixamos levar por encomendas
em formato bonitinho com o intuito de não dizer nada e ficar tudo como está?
Não! É certo que não.
Não! É certo que não.
Pior ainda é que quando se busca um
pensamento mais profundo, não fica difícil notar a falta de alma, de aspiração,
de inspiração. Falta um quê de Giordano Bruno, falta uma nobreza de coração e
mente que vem antes mesmo de dizer, de escrever. Talvez falte o fantasma das
fogueiras: será que a Inquisição está fazendo falta? É curioso: alguns dos mais
inspirados versos da MPB foram nos anos da ditadura.
Será que se não houvesse escravos, Castro
Alves não “flutuaria”? Os versos de Castro Alves
foram brilhante falando de tudo, portanto, não foram os navios negreiros que o
fizeram.
Não é a falta de sombras mórbidas que cala os corações e mentes de hoje, mas a falta de um brilho com ligação mais profunda com o eu interior, ou uma “sombra” que nos siga e fale conosco, e nem precisa ser a que acompanhava Sócrates e o mantinha absorto; ou algo como Charles Dickens* que, dizem, conversava com seus personagens.
O mundo de hoje luta contra as agruras,
que de fato não são somente de hoje, mas de sempre, com as mesmas armas que
também são de sempre, exceto pela liberdade, fato novo, que é mal utilizada, ou
mesmo ignorada. Será mero comodismo? Martela em minha mente um pensamento de
Pietro Ubaldi: para homens novos, métodos novos. E os métodos milenares fazem
com que o homem velho desejoso, necessitado de renascer, agonize.
E o homem velho não morre e segue a bater cabeça, tentando dar vidas e cores aos instintos, talvez como válvula de escape, sobrepujando a inteligência que tem única serventia: garantir os prazeres momentâneos. Nós, míseras formigas a nos perdemos ante os riscos que os destinos e fados impõem. Eis uma nova fogueira que queima mais lenta que a de Giordano Bruno, que morreu, mas vive.
(AEM, 2006)
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