O artista
Vermeer (31 de Outubro de 1632 - 15 de Dezembro de 1675) nasceu na cidade de Delft, Holanda, filho de um comerciante que
negociava com diversos produtos, entre estes, seda e obras de arte, tendo
inclusive sido admitido na Guilda de S. Lucas[1]
e travado relações com artistas como Balthasar Van Der Ast[2].
Acredita-se que tenha sido isto a fonte de inspiração de Vermeer para que este
se inclinasse pela arte, pois pouco se conhece da vida do artista, que ao lado
de Rembrandt foram os principais artistas do barroco holandês.
Embora tenha conseguido
reconhecimento em seu tempo, Vermeer produziu poucas obras, sendo que estas
sejam em torno de pouco mais de trinta. De formação calvinista casou-se com
Catharina Bolnes, mulher de formação católica, com quem teve quinze filhos. No
inicio da vida de casados aparentemente não tiveram dificuldades financeiras,
pois puderam sustentar sem dificuldades o crescente número de filhos, mas isto
se deve, provavelmente, a boa situação da família da esposa. Mas esta boa
condição se perdeu com o tempo, devido, talvez, ao elevado número de filhos.
Ainda houve a abertura dos diques como forma de defesa pelos Paises Baixos, pela
ameaça da invasão francesa, que inundaram terras que lhes eram fonte de renda.
Isto teve um efeito devastador para o artista que adoeceu e sucumbiu em menos
de dois dias.
Falsificações
Não
se sabe ao certo quantas obras Vermeer teria legado; atestadas são pouco mais
de trinta, e parte da dificuldade de identificar suas obras, além da
obscuridade de sua biografia, vêm de um outro artista holandês do século XX:
Van Meegerem (1889-1947). Este artista, embora virtuoso, teria sido relegado
pela história por ser considerado ultrapassado, mas usando de seu talento criou
obras novas ao estilo Vermeer que vendia por altos valores como sendo
autenticas do artista barroco. Sua farsa foi descoberta com o fim da segunda
guerra, pois os aliados encontraram obras desconhecidas de Vermeer com líderes
nazistas. Descobriu-se que estas haviam sido negociadas por Meegerem que foi
preso por isto e seria julgado por traição e por apoiar os nazistas;
provavelmente seria condenado à pena de morte por estes crimes. Para se livrar
destas acusações Meegerem revelou que as obras eram pintadas por ele mesmo;
isto, após provar o que dizia, pintando uma tela na prisão diante de
especialistas, levou-o a condição de falsificador e foi condenado por isto,
porém morreu em 1947 antes de cumprir a pena e deixando uma incógnita para
História da Arte sobre as obras de Jan Vermeer.
Barroco holandês
Diferente do período Barroco nos paises católicos, que viviam sob a
sombra pesada da Reforma e que tinha temas religiosos como principal
inspiração, a Holanda protestante que vinha de recente libertação do julgo
espanhol, vivia uma era de crescimento econômico e intelectual. Havia uma certa
“liberdade para se expressar”, o que atesta a obra A Lição de Anatomia do
Dr. Tulp - 1632 de Rembrandt; obra impensável em paises católicos.
Na
Holanda, este período foi marcado também por retratar com realismo cenas e
personagens comuns, até pelo que se pede na religião protestante; distancia-se
da nobreza e parte também para a pintura de paisagens e natureza-morta.
Nas cenas de
interiores realistas Vermeer é o grande mestre holandês.
As Obras
As obras de Vermeer são marcadas pelos signos e críticas à sociedade da
época. Mostram um enquadramento geométrico sempre com linhas horizontais e
verticais. Contrastes de claro e escuro, característico do barroco, são
marcados por personagens com faces e detalhes do corpo e roupas iluminadas;
elementos chaves para interpretações da obra são iluminados também. Destaco
neste ponto às mãos de Cristo na obra Cristo na Casa de Marta e Maria[3].
Em contrastes à luz as obras apresentam fundos escuros envoltos, por vezes, em
mistérios, “denunciando” os pecados de sua época: preguiça, amores secretos,
sedução, embriagues, etc. Obra clássica, A Menina de turbante[4]
(obra que inspirou o filme Moça com Brincos de Pérola[5]),
traz este contraste e a maestria do artista ao trabalhar cor e luz e a
sensualidade.
Mas a virtude também existe na obra de Vermeer que pode ser vista em A
Leiteira[6]
e A Rendeira onde pode se ver mulheres centradas em seus afazeres
domésticos. Outra virtude, a sabedoria, pode ser vista nas obras O Geógrafo[7]
e O Astrônomo[8];
atento à ciência que nascia, Vermeer mostra ser um homem de seu tempo que
vislumbrava o futuro.
Duas paisagens de Delft, são os legados de Vermeer para sua cidade natal.
Rua de Delft[9] mostra
também enquadramento e geometria. Aqui a luz irradia no exterior das
construções e nos personagens simples fechados em seus afazeres. Mas os
interiores são escuros como se a esconder os segredos dos moradores que se
mostram virtuosos. Vista de Delft[10],
considerada uma das dez melhores obras de arte de todos os tempos por críticos
ingleses nos anos oitenta, traz também o virtuosismo do artista em seu trabalho
de luz e sombra, mas aqui a luz aparece em primeiro plano, iluminando a areia e
os poucos personagens à beira do rio e no plano de fundo dando destaque à uma
torre de uma igreja, deixando a sombra em um plano central da cidade. Os
prédios envoltos em pouca luz refletem sua escuridão nas águas, mas a torre
iluminada não aparece, esta que está quase no mesmo plano da torre da esquerda
que é refletida no rio.
A Rendeira
O virtuosismo de Jan Vermeer eu já conhecia pelas fotos de suas obras e
por comentadores de seus trabalhos, porém, ao estar ante a obra A
Rendeira, obra de riquíssimos e precisos detalhes, e descobrir que esta
não era maior que a capa do livro que tenho do artista me surpreendeu de fato.
Esta obra diferencia-se de outras obras de Vermeer que mostram
personagens com os signos dos vícios, esta, assim como A Leiteira,
mostra outro aspecto das mulheres: a virtude. Nesta obra a luz irradia na
personagem e mesmo no plano de fundo. As sombras aparecem em um canto pequeno,
mas mesmo aí surgem cores e luz.
O rosto baixo, mostrando concentração, esconde os
olhos, mas estes claramente estão fixos nas mãos e no trabalho, o que parece
ser o único pensamento da mulher. Uma trança no cabelo parece coroar a virtude.
Até mesmo os tecidos trabalhados estão envoltos em luz; assim devem ser
os propósitos, um claro contraste com a obra Jovem Adormecida à Mesa[11],
obra, cujo pecado capital da preguiça aparece, isto após, aparentemente a
mulher ter bebido vinho; uma garrafa iluminada faz o elo com a personagem,
sugerindo uma provável embriaguez; nesta obra o ambiente está pouco iluminado e
a falta de luz acentua-se sobre a cabeça da jovem.
Em A Rendeira os tons amarelos e ocres característicos do
artista também atestam a obra. Nesta obra não há quadros nas paredes, portas
entreabertas e janelas que caracterizam outras obras de Vermeer; também não há
objetos que denuncie falhas morais, tais como cartas, taças e garrafas; há
apenas agulhas e tecidos. A parede do fundo é mais um elemento a cercar a
mulher, fechando-a em si mesma. As mãos aparecem iluminadas como as mãos do
Geógrafo e as mãos de Cristo (Cristo na Casa de Marta e Maria).
Nesta pequena obra, Vermeer parece querer colocar toda a grandeza da
virtude, todos os detalhes que parecem simples, mostram a sutileza e a
determinação virtuosa da mulher. Ou como a mulher deveria ser e agir.
A Rendeira
24,5 x 21 cm
1669-70
Óleo S/ Tela
Museu do Louvre - Paris/França
Bibliografia
SCHNEIDER, NORBERT. Vermeer, A obra completa. Alemanha: Taschen, 1997.
Tradução de Souza de Almeida,
CARLOS. Portugal, 2005.
Notas
[1] Guilda de S.
Lucas: mais famosa corporação de ofício de artistas européia que homenageia o
evangelista São Lucas.
[2] Balthasar Van Der Ast. Pintor
holandes considerado um dos pioneiros da natureza morta.
[3] Cristo na
casa de Marta e Madalena - 1655. Galeria Nacional da Escócia –
Edimburgo/Escócia.
[4] A Menina de
Turbante - 1665. Museu Mauritshuis – Haia/Holanda.
[5] A Moça com
brinco de pérolas (Girl with a Pearl
Earring) - 2003. Filme inglês
dirigido por Peter Webber.
[6] A Leiteira –
1657-58. Rijksmuseum, Amsterdã/Holanda.
[8] O Astrônomo
– 1668. Museu do Louvre, Paris/França
[9] Rua de Delft
– 1657-58. Rijksmuseum, Amsterdã/Holanda.
[10] Vista de
Delft – 1660-61. Museu Mauritshuis – Haia/Holanda.

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