quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

RESPOSTAS À VIDA


Era ainda garoto - tinha treze, quatorze anos - não me lembro exatamente quando testemunhei este fato inusitado e único em minha vida, sei que jamais esqueci o que vi e principalmente o que ouvi, e deixo, com minhas palavras, a página daquele sucesso que teve como cenário um campo de várzea em uma fria manhã do inverno paranaense. 

Naquele dia eu corria como um desesperado, mais para manter-me aquecido do que propriamente com intuito de jogar futebol. E bem em verdade, penso hoje, que todos os moleques faziam o mesmo. Fugíamos dos contatos, mas estes eram inevitáveis. Um destes contatos teve uma pegada mais forte.


Um "carinha" de nosso time, o Luizinho "dividiu" uma bola com um tal de "Zanella" e o tal do "branquelo sardento", assim o chamávamos em "off", partiu para o revide. Foi aí que a casa caiu.

Havia uma certa rivalidade entre nós por sermos da cidade e eles um time de fazenda, e isto nos faziam diferentes: estúpidos, assim acreditávamos. Após alguns empurrões daqui, uns chutes dali; muitas ofensas de parte a parte com palavras impublicáveis, os maiores entraram na briga e a pancadaria se generalizou. Não sei se bati em alguém, mas com certeza apanhei muito. Fiquei com saldo de uma contusão na perna que doeu alguns dias, um corte na boca, um olho dorido, e, principalmente, muitos desafetos na fazenda São Pedro, a maior da região. Destes detalhes lembro muito bem.

Quando a coisa começou a assentar sobrou para o Julho e o "Café", dois brigões reconhecidos na cidade, o ensejo de manterem a chama da rivalidade. Não demorou muito e os dois recomeçaram a bestialidade. Com a molecada a gritar entusiasticamente às voltas, os "grandões" trocavam violentos socos. Entusiasmado com a briga não demos conta de um homem que se aproximou. Um velho que arrastava a perna direita e trazia na face, as marcas de décadas de lutas; nos cabelos e na barba mal feita trazia a neve de quem já vive os dias do inverno da existência.

Postou-se próximo dos rivais que àquela hora rolavam no chão, na grama gelada pelo orvalho que nem o sol do meio dia conseguiu aquecer, e deixou transparecer um sorriso melancólico, talvez de piedade, talvez por ironia, ou quem sabe, simplesmente achou aquilo tudo muito engraçado. Voltou os olhos para nós, que, como por encanto, silenciamos, enquanto os garotos que se arrastavam no gramado pararam de brigar, mas não tiveram forças para erguerem-se.

Deu uma volta ao redor dos caídos e dirigiu-se em nossa direção - os expectadores - e foi face a face olhando no olho de cada um. Não o consegui fitá-lo. Intimidado baixei os olhos, assim como todos os outros. Ao menos os que pude ver se portaram tímidos ante o homem. Estávamos extasiados e envergonhados. Retornou para junto dos lutadores e, de forma branda, começou falar a nós que ouvimos como fossemos platéia interessada.

- "Bravo, meninos bravos!.
Viva a luta dos instintos!
Viva a arena e seus gladiadores!
Viva..., mil vivas, aos espectadores felizes!
Aplausos a força, ao sangue, ... às almas inglórias."

Por um instante parou de falar, como se a procurar palavras, ou talvez a nos dar tempo para resposta, mas ninguém ousou interpelá-lo, sequer conseguíamos nos mover, estávamos todos como imobilizados, sem contar que nada entendíamos, mesmo assim prosseguiu.

"- O que dizer das forças humanas?"
Surgem do âmago e explodem como vulcão. Um Vesúvio dormita em cada um.
Ah! Os vulcões. Lançam cinzas encobrindo vales, vilas, cidades ... Cospem suas lavas e queimam, corroem tudo que surgir à frente. Uma fúria de fogo.

O que dizer das forças ocultas que não vemos, mas que nos domina? As forças que mostram quem realmente somos. Quase sempre nos revela como vulcões, terremotos, tempestades. As forças que revelam as nossas tormentas. Daí quando explodimos, lançamos terror, barbárie, estupidez. Nos revela poderosos e incontroláveis.  Por isto que vivemos a nos arrastar, a nos embriagarmos de ignorância. Não conseguimos o controle interior, não temos o domínio sobre o vulcão latente em nosso íntimo. Quando os desequilíbrios da vida nos cobram paciência, explodimos em irritação; quando nos cobram compreensão, explodimos em indignação; quando nos cobra sabedoria, explodimos em arrogância; quando nos cobram amor, explodimos em ódio. Há também os vulcões adormecidos. Passam tempos estáveis. Aceitam os reveses e assimilam. Estes, porém, têm seus limites e quando as tormentas tornam-se fortes demais desestabilizam e também explodem."

Baixou os olhos em direção ao Julho e ao Café, estes se levantaram, contudo ficaram imóveis olhando-se como dois boxeadores em início de luta: olho no olho. Nem a força moral daquele homem, conseguiu aplacar a rivalidade.

Foi até a pequena área do campo, onde o gramado apresentava falhas, pegou um pouco de terra, para em seguida, dar prosseguimento à palestra

"- Vejam está terra. A mesma que dá vida às lavouras e aos campos que engorda o gado.
A terra que dá a vida... Terra... vermelha como sangue. Herança do vulcão adormecido. Isto mesmo! Com a morte da fúria interior, sobrevêm os equilíbrios: tempo..., evolução...

E quanto a vocês? O que há dentro de cada um de vocês, hoje?

Fúria e desequilíbrio? Renovação e vida? Que respostas darão ao mundo, quando este vos cobrar paciência, tranqüilidade, compreensão, amor?

O mundo vive a cobrar respostas.

Cuidado ao dá-las!

Saibam: sempre que caímos, devemos ter a consciência que caímos em nossos próprios precipícios. E sempre somos nós mesmos os primeiros a respiramos a atmosfera que criamos.

Saibam que um tiro como resposta não matou o sorriso de Paz;
A cicuta como resposta não matou a Sabedoria;
A cruz como resposta não matou o Amor.

Saibam que as respostas do homem não podem ferir o Eterno, portanto, sejam pelas respostas que traduzam Amor, ou no mínimo compreensão."

O velho fixou o olhar nos dois valentões que ali bufavam seu ódio, estendeu as mãos e perguntou:
- Que resposta vocês darão a mãos estendidas pedindo fraternidade e compreensão?
Os brigões nada responderam, viraram e se foram. Cada um pegou seu rumo.

O sábio em tom quase imperceptível repetiu a pergunta:
"- E para uma mão estendida pedindo compreensão, fraternidade?"
E conclui:
"- Para uma mão estendida pedindo compreensão..., fraternidade...: dá-se as costas!"

(AEM, 2004)

FUGA FUGAZ

Precisava de um simples gesto para abrir a porta e fugir.

Antevendo sua liberdade pegou a chave olhou-a e pôs-se a relembrar de seus dias vividos até ali.

Suas lembranças trouxeram suas fraquezas, suas solidões e suas dores: sua pena.

Porém, não admitia a culpa própria que causou seu desejo de fugir da necessária prisão; ou talvez, fosse este o motivo maior do desejo da fuga insólita: as próprias fraquezas.

Olhou fixo para a chave e tomado de infinda desolação, abril a porta e se foi. Tomou sua dose de falsa liberdade.

Atravessou a porta e viu-se livre; encontrara a liberdade plena que buscava. A liberdade era tanta que não mais tinha meios de conter as insuportáveis dores e angústias atrozes, tudo em inimaginável ebulição, por se tornar, após cruzar a porta, um Ser sem máscaras.
  

(AEM - nov/2004)

Exilado de Capela

Longe das humanas e opacas luzes, revela-se com mais nitidez as Maravilhas do infinito. Um olhar experiente pode nomear os mais brilhantes pontos que a noite oferece: Capela, Sírio, Canopo, Alfa de Centauro, Vésper (Vênus); as constelações que determinam os destinos para os que não o fazem por si mesmo: Touro, Virgem, Capricórnio, etc.

O infinito que chama um mísero exilado; infinito que parece clamar pelo filho deserdado da velha e reconstruída morada, então transfigurada em renovada e feliz, e na qual, tal como adolescente ingrato, ao Pai se faz indigno pelo vício nefando da alma, e é enviado ao degredo para novas paragens, onde terá de construir uma nova terra.

E nesse degredo, quando abatido por angústias que assaz oprimem o peito e enegrece a mente a alma busca nos horizontes aquela nave que, vencendo o espaço à luz, virá ao resgate e daí levar de retorno ao Paraíso perdido em algum lugar no Vasto Éter, em um tempo que foge à lembrança.

Brilha noite! Luzeiro eterno a indicar os caminhos, a torturar um coração preso ao pó do próprio destino e incúria.

Infinito que parece me ouvir e responder:
- Anjo decaído, aceita o destino e a oportunidade em adquirir valores e construir em si as “asas de Emmanuel”; e então voar rumo ao Lar da qual fora banido.
Mas, ... não! Não é somente para isto que para cá foste enviado: O Sr. dos Tempos, para estas paragens o enviou, não apenas para construir tuas asas mas, também para ajudar, da maneira que for possível, a alar teu Orbe: tua nova terra.

Regozija-te, e então, acalme-se e não deseje a fuga, por vezes em desespero, talhando asas como Dédalo e Ícaro. Não! Não espere mais uma nave surgida dos confins para um imerecido resgate. Espere tão somente não ser posto à esquerda do Mestre no dia da redenção dos justos da tua nova Terra.

(AEM, 2003 - 2005)
Série Epílogo?
2012
Xilogravura

RETRATO ROMANO


Embora a arte romana, sobretudo o retrato, tenha sofrido influências de quatro correntes que, segundo Bianchi Bandinelli[1], são os de ascendência médio-itálica, o retrato de ascendência patrícia, o retrato helenístico e o retrato médio-itálico com influência helenística, há um predomínio da influência grega, até porque como afirma Bandinelli há uma corrente médio-itálica que também deriva do retrato grego; aliás, este é mais um capítulo da forte presença da cultura grega sobre a romana. Mesmo no período republicano quando se desenvolveu o retrato patrício, este era feito por artistas de educação grega[2].

O retrato realista somente surgiu entre os etruscos e na média Itália após já estar consolidado na Grécia, ou seja, isto também é mais um fator que demonstra que os gregos estão mais evoluídos que os demais povos da península italiana.

E desta mistura com predomínio grego, principalmente do realismo, surgirá como uma variante deste, o retrato de identidade romana, a partir do período da ditadura de Silas (82-79 aC).
O inicio deste período pode ser identificado, segundo Bandinelli, pelas moedas onde foi colocado o retrato de Júlio César (100 – 44 aC), sendo este o primeiro a infringir a lei que não consentia que fossem colocadas imagens de pessoas vivas em moedas[3]. Posteriormente Otavio foi autorizado pelo senado a fazer o mesmo.

Nesta época a província da Ásia Menor estava sob forte crise e seus artífices emigraram para Roma, a mais próspera cidade, e certamente foram responsáveis pelos retratos realistas.
  
Característica do retrato romano
Bandinelli afirma que o retrato romano caracteriza, sobretudo pelo minucioso realismo, que ama descrever as minúcias das epidermes, quase como se se tratasse de um relevo geográfico[4]. Neste contexto Jocelyn M. C. Toynbee escreve em A Arte dos Romanos que floresceu cerca de 75-65, um grupo de retratos esculpidos em que o realismo helenístico atingiu sob os auspícios romanos aquele máximo de desenvolvimento a que tem aplicado a denominação de “verismo”.

As esculturas romanas, além do realismo, parecem ter ainda a finalidade de elevar uma condição psicológica do retratado, onde são exaltadas as características de castas, históricas, posição social e outras que denotam que o retratado tem méritos superiores ao mundano, isto faz Bandinelli expressar: O retrato romano do século I a.C. não pode pois, absolutamente, ser compreendido todo sob uma única etiqueta ou uma só definição.  A base de uma pesquisa comum de realismo tem um fundamento antes ideológico do que artístico...

O retrato romano é, antes de tudo, uma forma de afirmação, de difusão pessoal, de perpetuação, seja nas sendas da política, seja na doméstica, onde os patrícios cultuavam seus antepassados e suas histórias, até como documento para avalizar a casa onde estão expostas. O retrato realista esculpido satisfazia uma especial necessidade psicológica e social[5].

Uma característica importante se verificou nas esculturas de Augusto em que há uma mescla entre o idealismo helênico e a individualização das feições[6].  Ou seja, era a busca das feições e características próprias do imperador com o ideal criado na arte, na filosofia e nos mitos gregos. Mais uma vez se verifica a influência da cultura grega sobre a romana.

 Relações do retrato romano com o retrato grego.
Os gregos esculpiram seus retratos com o intuito político-social, diferente dos romanos que levaram, além da esfera pública, para a vida provada. Este retrato romano, que penetrou por todas as os âmbitos patrícios, como já visto acima, é uma variação do retrato grego, da qual sofreu forte influência. Na escultura uma das marcas que se desenvolveu em Roma foi o surgimento dos bustos, algo não admitido entre os gregos que apenas concebiam suas obras de corpo inteiro, sem “mutilações”.

Outra diferença foi a arte do retrato ser levada ao máximo do realismo em Roma, embora estes tenham sido iniciados com artistas grego, sobretudo após o fim da república romana; mas conceber minúcias de grande realismo é um legado vindo do médio-itálico-helenístico.

Diferentemente dos gregos, os romanos sofreram várias influencias, e desenvolveram suas obras em uma mescla destas, embora a arte grega, tanto pelas obras conhecidas e apreciadas pelos romanos, tanto pelos artistas que emigraram para Roma, ajudou a moldar a arte romana com mais intensidade, sendo esta como uma herdeira daquela, levando, contudo a arte da escultura a um classicismo refinado e plástico[7].

A nudez, marca das esculturas gregas não foi seguida em Roma que produziu os retratos com os trajes que definiam também a condição político-social do retratado. Assim como as couraças dos soldados como afirma Plínio, embora este, segundo Bandinelli[8], cometesse um anacronismo quando tratou do assunto, mas não se pode negar que a arte romana seguiu este conceito.

Relação do retrato com a política, sociedade e cultura
 O retrato na sociedade romana teve um papel importante pois, acima de tudo, foi um veículo de propagação e de “eternização” de imperadores, cônsules, senadores e de demais patrícios ricos e influentes.

A própria dimensão que tomou a questão do retrato para os romanos já nos dá uma noção de suas condições, pois este legado diz, mesmo para nós, a força daquela sociedade que se desenvolveu e que dominou o mundo conhecido à época. Isto colocado em seu próprio tempo ante seus inimigos faz parecer algo grandioso e que deve ser admirado e temido. Estátuas e moedas romanas com imagens de seus imperadores, divinizados, que somados pelo ideal helenístico com o realismo romano em suas efígies davam a medida de seu poder de penetração em todo império.

Mas o retrato tinha também um caráter doméstico no culto familiar. Uma casa decorada com estátuas onde se representam os antepassados mostrava uma família de tradição; uma família “venerável”. Entre as famílias ricas os mortos tinhas suas tumbas decoradas com seus retratos.
O retrato tinha ainda o intuito de mostrar, através dos detalhes quem era o retratado: vestes, penteado, modo de se representar dizia muito da personalidade e a origem, mesmo não se sabendo quem era de fato o(a) retratado(a).

Conclusão
            A arte do retrato em Roma foi muito desenvolvida, até pela mescla de influências que, embora a arte grega tenha sido a mais marcante. Mas tem-se que dar ênfase a influencia médio-itálica pela forma realista dos retratos, sobretudo a partir da era de Júlio César, o que deu a este a possibilidade de fazer produzir moedas com sua imagem.

            Através da história foi comum em todos os povos produzir arte como monumento e documento dos reis e imperadores de forma a se firmar em uma natureza superior ante os súditos. Mas entre os romanos este estratagema foi levado à perfeição com seus imperadores e governadores sendo representado em majestade e detalhes pelos artistas.

            Mas como Roma se tornou uma cidade muito poderosa e rica, este privilégio não ficou apenas com os imperadores, tendo seus mais nobres cidadãos também desfrutado desta aura de endeusamento e sobrevida, sendo alguns deles chegados até nosso tempo.

            Fator importante a salientar é que este interesse romano pela arte e cultura grega foi importante para que se mantivesse viva a arte clássica helena, até pelas muitas cópias feitas pelos romanos das estatuas gregas. Enfim, sejam produzidas por artistas gregos ou romanos a arte grego-romana foi a base da arte ocidental, sendo esta a fonte para o Renascimento na Idade Média, que se desenvolveu sobre seus pilares, onde se mesclou em princípio o paganismo e o cristianismo, até a influencia dos mitos perderem sua força pela ação da igreja, mas a essência da arte se mantém viva e vibrante desde aqueles dias de Silas, Júlio César e Augusto até o hoje.



[1] Bandinelli, Ranuccio B. - O relevo honorífico e o retrato.
[2] Bandinelli, Ranuccio B. – Idem
[3] Bandinelli, Ranuccio B.  – Ibid
[4] Bandinelli, Ranuccio B.  – Ibid
[5] Toynbee, Jocelyn M. C. – A arte dos romanos
[6] Toynbee, Jocelyn M. C – Idem
[7] Toynbee, Jocelyn M. C. – Ibid página 2
[8] Bandinelli, Ranuccio B.  – Ibid página 1

(AEM, 2015)

TEATRO PADRE BENTO - ARQUITETURA E HISTÓRIA


TEATRO

Rua Francisco Foot, s/n – Gopoúva  - Guarulhos/SP

            Com obras concluídas em 1937, com recursos da Caixa Beneficente e mão-de-obra dos internos, o Clube Padre Bento foi concebido com o intuito de dar vida social aos internos do sanatório localizado no bairro de Gopoúva em Guarulhos que para lá eram levados compulsoriamente. Construído em art déco, com projeto assinado pelo engenheiro Francisco de Palma Travassos, o edifício abrigava cinema, cassino, bar, salão de baile e biblioteca. Quando de sua inauguração, este espaço era comparados aos mais luxuosos de São Paulo, não havia nada igual para população da cidade que lhe era sede, muito provinciana e que, naquele tempo, era considerada muito distante do centro de São Paulo, esta uma das razões de implantar nesta região um leprosário.

            O Clube era luxuoso: seu hall de entrada e a escadaria de acesso ao salão eram revestidos com granito; o salão em seus trezentos metros quadrados, onde eram realizados os bailes dos internos, que eram animados pelas melhores orquestras de São Paulo, era revestido por belíssimo assoalho e iluminados por candelabros, possivelmente de cristal; o salão possui amplas janelas e três sacadas. O cinema, que ficava no piso térreo, possuía quatrocentos lugares.
            Como destaque, devido à proibição radical de contatos com os internos por não doentes, havia uma tribuna, cujo acesso era pela lateral do Clube; lá era onde as orquestras se apresentavam e de onde os familiares, que não haviam abdicado dos seus parentes contaminados, podiam vê-los divertir-se no Salão de Baile.

O local teve seu esplendor como contraste com a razão para a qual foi criado, sendo um local onde os internos podiam esquecer um pouco de seus destinos. Quando se descobriu a cura para a doença e as internações compulsórias foram encerradas, em São Paulo isto aconteceu no final da década de sessenta, o clube começou a entrar em decadência.

O clube que era administrado pela Caixa Beneficente, rica nos tempos da internação compulsória, perdeu sua força com o desinteresse dos patrocinadores e da sociedade que não precisavam mais confinar os hansenisianos. A partir de então o clube para se manter foi transformado em cinema aberto para a população do bairro que já na década de sessenta começava a se adensar. Mesmo abrindo suas portas o clube não conseguiu se manter ao longo dos tempos e deteriorava-se cada vez mais sem as devidas manutenções.

Vários fatos demonstram a  falta de cuidados e apoio com o local, entre estes se destacam o incêndio na cabine de projeção; os candelabros que desapareceram; a cessão do espaço do salão, outrora luxuoso, para oficina de molduras; abertura de uma oficina de sapatos onde antes era o salão de jogos; os porões serviram para abrigo de sem tetos; mesmo a prefeitura fez uso indevido do espaço, fazendo sob o palco uma fábrica de urnas funerárias.

Este estado de abandono perdurou até o início deste século quando o espaço, que pertencia ao Governo do Estado de São Paulo, teve sua administração cedida para  prefeitura de Guarulhos. Após este processo e com recursos da Petrobrás o edifício foi restaurado e entregue à população como Teatro Padre Bento, no ano de 2007.

O edifício foi tombado pelo CONDEPHAAT com resolução em 14/06/2011 e pelo Conselho Municipal de Patrimônio de Guarulhos.

SEGREGAÇÃO

A hanseníase, conhecida também como Lepra ou mal de Lázaro, doença conhecida destes os tempos mais remotos da civilização, até a descoberta da cura nos anos cinquenta do século passado, sempre teve o mesmo meio de se evitar o contágio: a segregação.

Sem tratamentos eficientes, a doença degenerativa, evolui lentamente, deformando os infectados até o fim, levando muito sofrimento físico e moral. O abandono por parte de familiares, temendo o contágio, era o primeiro sinal da nova vida que se apresentava. O confinamento era o golpe final em quem apenas esperava pela morte sem expectativas de cura.

O mal que era de alcance universal começou a ter momentos mais dramáticos no fim do século XIX, quando em uma conferência sobre lepra em Berlim[1] começou a se propor o isolamento dos portadores da doença. Este também foi proposto na Conferência Americana de 1922. Estes fatos levaram o governo brasileiro a tornar Lei a internação compulsória em 1923. Seguindo por esta via o Estado de São Paulo criou em 1931 a Inspetoria de Profilaxia da Lepra, órgão responsável pela prevenção da doença com o intuito de eliminar o mal no Estado, pois se acreditava que retirando os infectados de contatos sociais a doença tenderia a erradicação. A segregação dos hansenisianos em todas épocas da história humana sempre foi utilizada, mas o que chama  atenção é isto se oficializar em todos os paises no surgir da modernidade.

No Estado de São Paulo havia cinco locais de confinamento destinados aos portadores de hanseníase, os chamados Asilos Colônias. Além do Sanatório Padre Bento em Guarulhos havia os sanatórios de Santo Ângelo em Mogi das Cruzes, Pirapitingui em Itu, Cocais em Casa Branca e Aimorés em Bauru. Estes sanatórios eram divididos em três partes: área sã, área mista e área contaminada. Como norma infectados eram terminantemente proibidos de entrar nas áreas chamadas sadias.
Nestes locais de confinamentos, onde não havia esperança de sair, os internos, em muitos casos, perderam o contato com os familiares, que simplesmente os abandonavam. Devido a esta situação constituíam-se novas famílias dentro dos sanatórios, algo que não era apoiado pelos administradores dos hospitais das colônias.

            A situação tomava contornos mais dramáticos quando se separavam as crianças dos pais, tanto quanto os pais eram os doentes, ou quando eram as crianças as portadoras.

SANATÓRIO PADRE BENTO

            Os Asilos Colônias recebiam recursos das Caixas Beneficentes que por sua vez eram sustentadas por doadores privados e por grandes empresas. Pelas realizações nos complexos, como exemplo pode ser citada a construção do Clube Padre Bento, avalia-se que os recursos eram elevados.

            Estes sanatórios possuíam duas administrações: a do governo, que eram mais relativas ao hospital e ao tratamento dos doentes e a dos internos que regulava a sociedade interna, que no caso de Guarulhos chegou a ter cerca de 1500 pessoas (número referente somente aos internados); estes sanatórios tinham uma vida independente e agitada podendo ser comparadas a pequenas cidades. Havia três “autoridades” nos asilos, todos internos: o presidente da Caixa Beneficente, prefeito e delegado, todos com poderes semelhantes aos da sociedade externa.

            O Sanatório Padre Bento, considerado modelo, isto para época, tinha todas as comodidades para minimizar o estado de isolamento dos contaminados. Além do belo e imponente Clube e do hospital, havia creche, igreja, centro espírita, casas para os casados, dormitórios com alas para homens e mulheres, campo de futebol, piscina e até uma pérgula onde os namorados iam passear sob olhar atento dos guardas. Esta pérgula, que pode ser vista por quem passa pela avenida Emílio Ribas, atualmente está abandonada, deteriorando.

            A enorme área do complexo após o fim da internação compulsória foi desmembrada e dada outros usos para os espaços. Sobraram ainda, além do Teatro e a pérgula, o Complexo Hospital Padre Bento (que após ser adaptado passou a atender a população, sendo este o único hospital estadual da cidade), a igreja, o centro espírita, algumas casas que eram para os internos e o campo de futebol.
            Nos anos noventa o estado construiu um conjunto habitacional em parte do terreno e foram aberto ruas pela prefeitura.

ATUALMENTE

Em 2007, como parte das comemorações dos 447 anos da cidade, a Prefeitura de Guarulhos entregou o Teatro Padre Bento para a população. O Teatro entrava em uma nova fase com a reforma e voltava a ter vida, desta vez sem segregação ou deterioração. Assim prosseguiu levando peças teatrais, oficinas e os mais diversos eventos aos guarulhenses. Porém, esta fase teve curta duração, pois no dia 21/09/2010, uma forte tempestade caiu sobre Guarulhos atingindo em especial a região onde está localizada o Teatro. A tempestade atípica pela quantidade de granizo, causou muitos danos aos bairros da região do Gopoúva, destruindo muitos telhados, entre estes o do Teatro.

Desconsiderando os danos causados pela tempestade, a Secretaria de Cultura de Guarulhos, responsável pela administração direta do Teatro, não tomou as devidas providências para manutenção e reforma da cobertura, que teve como resultado infiltrações e com isto as consequências naturais decorrentes do fato. Mais uma vez o Teatro Padre Bento, o mais importante monumento histórico de Guarulhos, teve de ser fechado porque as tantas avarias tornaram o prédio praticamente sem condições de uso para a população, com pisos mofados e soltando-se do chão. A situação atingiu um ponto em que o assoalho do Salão de Baile teve de ser totalmente retirado.

Mesmo sem estar com plenas condições de uso há ensaios, oficinas e apresentações nas salas e palco do teatro.

Este é o momento atual do edifício que aguarda providências da Prefeitura quanto à reforma e retomada de rumo para este espaço de tanta cultura e tantas histórias.


Bibliografia

RUBIO, Arnaldo. Eu denuncio o Estado. São Paulo. Navegar. 2002
SCIELO: http://www.scielo.br/




[1] Fonte: http://www.scielo.br/

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Expressão 
AEM - AST - S/D
30 x 20 cm

O PORQUÊ DO PERDOAR


O que passou pelas mentes dos espectadores quando o Cristo disse: “amai os vossos inimigos”?
 Sabendo-se que ainda hoje este conceito não é facilmente compreendido, pode-se ter uma idéia superficial do pensamento de uma sociedade bem mais embrutecida que a nossa, quanto àquela afirmação.
No Evangelho Segundo o Espiritismo, Kardec nos mostra os sentidos deste ensino, pois amar alguém que nos odeia da mesma maneira que amamos quem nos retribui em sentimentos, está até um certo ponto, desprovido de lógica. De fato a coerência não está em amar, e sim em não odiar, não desejar revides, não fomentar divergências e buscar compreender.

Considerando nosso estágio evolutivo, agir desta forma é já estar amando. Afinal não se pode querer amar alguém que nos quer o mal, da mesma forma que Jesus nos amou. A menos que já se tenha atingindo um grau moral de um São Francisco, Irmã Dulce, Chico Xavier, Ghandi, etc. Muitos Espíritos que vivem entre nós já estão neste nível, mas para a grande maioria resta a expectativa do futuro. No entanto, enquanto não chega o dia de nossa purificação, tentemos ao menos compreender.

O Mestre que disse para nos amarmos sem restrições, o disse não por simplesmente ser o correto a fazer, mas também por conhecer a condição das existências sucessivas do Espírito, que principalmente, quando infante na moral, ser um criminoso em potencial, sempre carecendo de perdão. E ainda por conhecer os segredos da humanidade.

Um destes segredos - que atualmente não é mais tão segredo assim - é a força latente dentro de nós, embora ainda não saibamos como utilizar tal energia. Falamos muito de fé, mas ainda não conseguimos sobrepô-la sobre nossas fraquezas.

Hoje é bem conhecido - principalmente pelos estudos de doutrinas psicológicas - a importância do controle mental; em qualquer obra sobre auto-ajuda fica bem explícito que nossa vida é ditada de acordo com nossos planos e nossa capacidade de criar.

É bem verdade que seremos no futuro o que pensamos e fazemos hoje, assim como somos hoje o que pensamos e fizemos ontem. Sob estas condições fica difícil crer que alguém tenha criado em sã consciência uma vida atribulada e infeliz. Então, como há tantos infelizes hoje, tendo estes crido em flores e frutos? Não se pode conceber alguém desejando para si mesmo, sofrimentos e atritos.

A ignorância é a resposta para as questões que se possa fazer no que se refere ao citado. Sonhos. Programações. As alternativas são estudadas em certos casos, até com minúcias; mas a vida vez por outra vem e dá o contra.

Ocorre que qualquer plano vai por terra, quando não é concordante com a Lei Maior. Todo pensamento ou atitude volta como reflexo para os autores; é a Lei. A Lei que não tarda e jamais falha. Vem sempre no momento certo e com precisão para que se cumpra.

A Lei que não há como fugir das penas que são impostas.
Nossos males ou os bálsamos de alivio e de felicidade que nos atingem é apenas a Lei que está agindo. É a causa e efeito; nas palavras dos orientais: é o Karma; ou como Jesus disse: a cada um segundo as próprias obras.

Neste nosso mundo, ainda de expiação, apenas um justo sofreu inocentemente, e este ainda pediu ao Pai que perdoasse seus algozes. Portanto, sabedores que tudo que nos afligi, é um efeito de que nós mesmos somos a causa, é mister que perdoemos nossos verdugos, nossos inimigos, nossos opositores e todos que não nos são afetos. Enfim estes são apenas criação de nossas mentes imperfeitas; de nossas mesquinharias; de nossas falhas morais. Principalmente se se considerar que quando personificado em um semelhante é fácil fechar os olhos e maldize-los pelas nossas desventuras. Mas, e quando as tribulações vêm em nós mesmos ou em alguém que nos é caro, através de chagas no corpo material? Ou quando enfrentamos as tragédias impostas pelas tormentas dos elementos? Odiamos quem? A natureza? Deus?

Por mais absurdo que possa parecer há quem responda afirmativamente a estas questões. O que dizer sobre isto, sendo o orgulho humano um dos nossos piores inimigos?

Creio que o bom senso diz que perdoando nossos inimigos, estaremos nos perdoando.
Será que não é o caso de até mesmo amarmos nossos inimigos, uma vez que estes estão apenas sendo os executores da Perfeita Justiça e nos dando a oportunidade de redenção?

Penso que esta é uma das razões do Cristo, quando nos deixou tão incompreensível lição.

(AEM, 2005)

SETE REGRAS DE PARACELSO


I
A primeira é melhorar a saúde.
Para isso deve-se respirar, com a maior frequência possível profunda e ritmicamente, enchendo bem os pulmões; ar livre ou assomando-se a uma janela. Beber diariamente, em pequenos sorvos, dois litros de água, comer muitas frutas; mastigar os alimentos do modo mais perfeito possível, evitar álcool, o tabaco e os medicamentos, exceto se por um motivo grave esteja submetido a algum tratamento.

II
Afastar absolutamente do teu ânimo, por mais razões que existam, toda a ideia de pessimismo, rancor, ódio, tédio ou tristeza.
Fugir como da peste de todas as ocasiões de lidar com pessoas maldizentes, viciadas, ruins, bisbilhoteiras, indolentes, mexeriqueiras, vaidosas, ordinárias e inferiores por natural baixeza intelectual ou pelos tópicos sensualistas que constituem a base dos seus discursos ou ocupações.

A observância desta regra é de importância decisiva: trata-se de mudar a contextura espiritual da tua ALMA. É o único meio de mudar o teu destino, pois isto depende dos nossos actos e pensamentos... O AZAR NÃO EXISTE.

III
Faz todo o bem possível.
Auxilia todos os desgraçados sempre que possas, mas jamais tenhas debilidades por nenhuma pessoa. Deves cuidar das tuas próprias energias e fugir de todo o sentimentalismo.

IV
É necessário esquecer todas as ofensas:
mais ainda, esforça-te por pensar bem do teu maior inimigo: a tua alma é um templo que não deve ser profanado pelo ódio.

V
Deves recolher-te todos os dias aonde ninguém possa perturbar-te, nem que seja por meia hora, sentar-te o mais comodamente possível e NÃO PENSAR EM NADA Isto fortifica energicamente o cérebro e o espírito por-te-ás em contacto com boas influências.
Nesse estado de recolhimento e silêncio costumam ocorrer-nos ideias luminosas, susceptíveis de mudar toda uma existência. Com o tempo todos os problemas que se apresentam serão resolvidos vitoriosamente pois uma voz interior te guiará em tais instantes de silêncio, a sós com a tua consciência. Esse é o DAIMON de que falava Sócrates. Todos os grandes espíritos deixaram-se guiar por essa suave voz interior. Mas não a encontrarás assim de imediato, tens que preparar-te durante algum tempo, destruir as sobrepostas capas dos velhos hábitos, pensamentos e erros que pesam sobre o teu espirito, que é divino e perfeito em si, mas impotente por causa do imperfeito do veiculo que lhe ofereces hoje para se manifestar. A carne é fraca.

VI
Deves guardar silêncio absoluto de todos os assuntos pessoais;
abster-te como se tivesses feito juramento solene, de referir aos outros, por mais íntimos que sejam, tudo quanto pensas, ouças, saibas, suspeitas, aprendas ou descubras. Durante muito tempo pelo menos, deve ser como CASA MURADA ou JARDIM FECHADO: é regra de suma importância.

VII
Nunca temas aos homens nem te inspire sobressalto o dia de amanhã.
Mantém a tua alma forte e limpa e tudo te correrá bem. Nunca te julgues só, nem débil, porque há atrás de ti poderosos exércitos, que não concebes nem em sonhos. Se elevas o teu espírito, não existirá mal que possa te tocar. O único inimigo a quem deves temer é a TI MESMO. O medo e a desconfiança do futuro são mãe funesta de todos os fracassos, atraem as más influências e com elas o desastre. Se estudares atentamente as pessoas de "boa sorte", verás que instintivamente observam grande parte das regras antecedentes; muitas das que obtêm riquezas, o mais certo é que não são de todo boas pessoas, no sentido justo, mas possuem muitas das virtudes que acima se mencionam. Por outro lado, a riqueza não é sinónimo de felicidade: pode ser um dos factores que a ela conduz, pelo poder que nos dá para exercer grandes obras nobres, mas a felicidade mais duradoura só se consegue por outros caminhos, lá onde não impera o antigo SATÁN da lenda, cujo verdadeiro nome é o EGOÍSMO. Nunca te queixes de nada. Domina os teus sentidos e foge tanto da modéstia como da vaidade, porque são funestas para o êxito. A modéstia retirar-te-á forças e a vaidade é tão nociva, que é como se disséssemos pecado mortal contra o Espírito Santo. Muitos grandes espiritos caíram despenhados dos mais elevados cumes por causa da vaidade, devendo a ela a sua queda muito possivelmente Júlio César, aquele homem extraordinário que se chamou Napoleão e outros."
Passamos a vida discutindo nossas limitações; discutindo problemas; lamentando oportunidades perdidas por isto ou por aquilo; passamos nossas vidas limitados em uma rotina aparentemente sem saída. Tudo isto porque nos esquecemos de quem de fato somos. Estamos tão escravizados neste mundo de limitações que por mais exemplos (e a todo momento surge um) de como as coisas são de fato não nos damos conta; ou simplesmente ignoramos, pois é mais confortável.

Profecias Maias

Sempre considerei estas histórias de fim dos tempos, fim do mundo, apocalipse, profecias, revelações, etc., coisas sem sentido, uma preocupação extra em um mundo onde o hoje já tem tantas cobranças e imposições. Penso que é bem verdadeiro o pensamento: o futuro a Deus pertence.
Mas as tais profecias maias me chamaram a atenção em dois pontos: primeiro o tal do alinhamento galáctico e segundo o que é chamado na profecia do tempo do não tempo.

Não sei se há algum fundamento astronômico no tal alinhamento, embora tenha visto algumas explicações sobre o fato que me pareceram conclusivas. Porém uma coisa é certa: eles, de certa forma, sabiam que havia um centro no universo, não sei se conheciam o sistema de galáxias, sistemas, aliás, que somente foi descoberto no século XX.

Ao se considerar que o Universo é constituído de galáxias, podemos afirmar que se não é possível definir o centro do universo é possível ao menos demarcar o centro da galáxia, no nosso caso a Via Láctea. Daí fica a questão: como eles sabiam de um tal centro que se alinhariam com os eixos do Sol e da Terra com tal precisão de data?

Sobre o tempo do não tempo (os dias atuais - segundo a profecia e o calendário maia), me chama atenção porque estamos vivendo em uma época em que tudo tem passado rápido demais, e cada vez parece estar se acelerando. Quem tem mais de trinta, trinta e cinco anos pode perceber isto com mais clareza. A forma como os dias, meses e anos estão passando já não deixam dúvidas de que algo está acontecendo.

Estamos chegando de fato nos fins dos tempos? Espero que não. Mas é certo que ao longo de sua existência a Terra passou por várias transformações. Dinossauros, eras glaciais, Lemúria, Atlântida, etc. embora os dois últimos sejam mais considerados como mitos, os primeiros são constatações cientificas. O que dá para concluir que se não for hoje, será amanhã, 2019 ou 2036 ou daqui a mil anos, talvez levem milhões de anos para algo grandioso e catastrófico acontecer, mas é certo, vai acontecer: meteoros, vulcões, erupções solares, eras glaciais, supernova, etc. É assim o nosso planeta e nossa galáxia. Sempre foi.

Mas, nós somos mais. Tenho convicção plena que mesmo que acabe o mundo, a galáxia e mesmo o Universo, nós viveremos sempre.

Portanto, estas dúvidas a parte sobre a profecia maia, não me perturbo com quando teremos de ir ver se passaremos à direita ou não do Pai. Porque o Pai é Pai: por pior que sejamos Ele sempre nos dará acolhida em algum lar por aí, perdido em algum canto do Universo. Quando (se) não houver mais Universo Ele dará um jeito. Enfim, Pai é Pai. 

(AEM, 2011)

Capitalismo: a revolução que deu certo?


Há muitas pessoas que olham nosso mundo com desconfiança e ainda sonham em nosso tempo com tempos que não deram certo. Talvez alguns momentos que tenham sido frutíferos com suas teorias que apontavam para um mundo de glórias para toda sociedade justifique suas idéias e ideais. Mas será que para nosso tempo e mundo valeria tentar uma volta de velhos conceitos que falharam outrora?

Por minha vez, sem medo de olhar pela história cheguei a uma questão insólita: capitalismo: única revolução sócio-política que deu certo?
Porém nunca estudei esta revolução; nunca tive uma professorinha me falando sobre mártires capitalista, ou sobre monumentos ao capitalismo. Talvez Ford e sua indústria. Quem sabe uma velha locomotiva a vapor? Consumismo? De fato mesmo é que nunca tive uma aula sobre a revolução capitalista porque esta está acontecendo desde outra revolução mais conhecida e, esta sim muito bem estudada, a revolução industrial; ou talvez antes, não sei ao certo.
Mas outras revoluções aconteceram antes e depois da industrial e aparentemente em seus propósitos não foram tão bem sucedidas.

Veja o caso das mais influentes da história.
Revolução Francesa: traz como legado o fato de ter moldado o mundo ocidental com seus princípios: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Mas, embora tenha nascida do povo, inclusive tendo como marco a queda da Bastilha (prisão símbolo de repressão monárquica), que foi literalmente derrubada pelos populares que não deixaram pedra sobre pedra, não seguiu seus passos como deveria, ou seja, não foi tão popular assim, tornando-se de fato, com o transcorrer do tempo em uma das mais violentas e ditatórias da história, pois além de Luiz XVI e Maria Antonieta, milhares e milhares de franceses foram torturados e executados, entre estes estavam lideres da revolução, como o próprio Robespierre. A Liberdade, principalmente de expressão, foi definitivamente suprimida; a igualdade apareceu somente na possibilidade de ser o próximo a ir passear até a guilhotina e lá ter separado o corpo da cabeça; em um mundo caótico o que falar da fraternidade?

Um estado de caos que seguiu até o insuportável. A solução deste caos todo mundo conhece: um general corso. Ou seja, a revolução que sonhava com o fim da monarquia local transformou-se em um louco pesadelo de uma monarca que queria todo um continente; um rei que se autoproclamou.
Dizem que a revolução francesa nunca acabou. Sou um deste que pensa assim e como os iluministas ainda sonho com o tempo de Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Quanto aos franceses de hoje nada posso falar sobre como anda sua liberdade e igualdade, mas quanto à fraternidade, creio que esta, a julgar pelo que testemunhei nas ruas de Paris, ainda está longe de dar as caras.
Outra revolução, a russa, esta mais decantada pelos estudantes, trabalhadores e políticos com uma pegada mais social, está mais caída ainda que a francesa. Assim como Robespierre e seus aliados, Lênin e os operários russos fizeram sua revolução, mas esta teve um fim bem mais melancólico que a francesa. E também, como a revolução francesa, foi extremamente violenta contra o próprio povo e também matou seus antigos reis; ainda, por mera coincidência, teve seu rei maluco.

Após a morte de Lênin, Stalin seguiu com o governo com a intenção de pôr ordem na casa. E conseguiu, pois, após ter vencido os alemães na segunda guerra, a União Soviética se tornou única potência a rivalizar com os Estados Unidos. Nasceu a guerra fria com corrida militar e espacial, mas a força soviética ao final dos anos oitenta deu sinal de colapso e enfartou de vez nos noventa. Antes potência, agora de chapéu na mão. Abandona de vez o comunismo e se lança à vida do século XXI. Como prêmio de consolação retorna à categoria de emergente ao lado de Brasil, China e Índia. Quase como um recomeçar depois de sepultar o comunismo.

Revolução industrial: foi o suporte de todas as mudanças que se seguiram após o século XIX. Nunca em toda história a humanidade viu uma evolução tão rápida. O ser humano voou, navegou sob os oceanos, curou doenças, descortinou o infinito, construiu armas superpoderosas, enfim, criou em menos de cem anos o mundo de hoje, que é totalmente diferente do antigo. Todas as nações ocidentais sejam como for a maneira como convivem em suas políticas a tem como fundamento. A revolução industrial seguiu em frente para se tornar em revolução tecnológica; a revolução de nossos dias. Em outras palavras uma revolução que cumpriu o que prometeu.

Revolução americana: esta é para fazer os comunas de plantão porem as barbas de molho, pois a outra revolução que se sustentou foi a americana. A primeira revolução popular a vencer o imperialismo europeu seguiu seu caminho embasado na democracia e liberdade, ao menos em teoria, para se tornar em menos de cento e cinquenta anos na maior potência do mundo; país mais rico e influente; tornar-se de colônia a colonizador. Apesar de todos os problemas que se avizinham ainda se mantém como líder mundial e ainda dando as cartas. Dá alguns sinais de cansaço, mas ainda parece longe de cair.
Outras revoluções ocorreram nestes últimos tempos com relativa importância. A chinesa é a mais digna de nota, pois esta nação milenar que viveu uma vida quase que inteira no campo vem agora para uma indústria poderosa que superou uma a uma as potências econômicas, ultrapassando todas até chegar onde está; ou seja, a segunda economia. Mas o que pesa contra o governo chinês é a forma de como conduz seu povo e país: repressão poderosa, escravidão, eugenia, pirataria e degradação ambiental são fatores fortes que anuncia colapso para breve.

De tudo o que se vê através da história fica um semblante de que o que deu certo mesmo foi o capitalismo e que os seguidores de Marx, tais como Lênin, Guevara e tantos outros valem mesmo como ótimos teóricos e idealistas, mas para o dia-a-dia o que vale mesmo é a liberdade de pensar, escolher, fazer e viver. Creio que Marx quando pensou a mais valia esqueceu do fator humano como fundamento; há com certeza um padrão em tudo, mas em essência somos diferenças. Sem contar que, para quem sonha com revoluções populares, parece que estas são as piores para o próprio povo, pois sempre traz em si muita violência e um maníaco de plantão; isto quem diz é a história.

(AEM, 2015)

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

O TRIUNFO DO DETALHE (E DEPOIS, NADA)

A GRANDE ÁRVORE - 1942
Chaim Soutine
Smilovitch, Lituânia, 1894 - Paris, França 1943


A Grande Árvore, 1942

Chaim Soutine
99 cm x 75 cm
Óleo S/ Tela
MASP

O detalhe

Um casebre despretensioso



Detalhe de A Grande Árvore de Chaim Soutine

 Em A Grande Árvore, Chaim Soutine cria uma forma, uma massa, quase abstrata, em pinceladas que parecem dançar e nada quer mostrar como um detalhe a não ser as próprias pinceladas que apresenta a obra em um expressionismo muito próprio. A árvore, dominando quase a totalidade do espaço da tela, tem seu desenho marcado por um tronco envolto em folhagens que parecem não querer criar formas figurativas, mas que mesmo assim se mostra como tal, tornando o figural em figurativo. A primeira vista o que surge são massas de verdes envoltos em azuis dando a forma ao desenho que, com isto, dá uma exuberância que domina a tela.
Mas, eis que em meio ao domínio verdejante um vermelho em duas, ou três, pequenas pinceladas surge criando um telhado. Surge um casebre quase que por acaso; despretensioso. O vermelho, que em traços diagonais discretos no canto inferior da tela, abaixo de toda massa, sustentado por pequenas pinceladas verticais, também em tons verdes, quase abstraindo as paredes, pode até passar sem ser notada, mas em sua simplicidade figural, mesmo neste detalhe cria-se o figurativo. E aqui Soutine cria uma ambientação que dá ênfase à própria árvore e a vegetação no entorno.

(AEM, 2014)

quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

ARTE E MODERNIDADE

    Enquanto Monet e Renoir miravam os banhistas e as frugalidades de La Grenouillère[1] figura 1, embora, estivessem buscando novos aspectos da vida moderna, Pissarro, no mesmo local e na mesma época voltava-se para uma fábrica e para o trabalhador. Nos fins dos anos sessenta do século XIX os artistas começam a criar e buscar uma nova era também para arte. Fossem buscando as diversões ou o cotidiano que já se apresentava com fábricas nos cenários dos pintores, o mundo novo, mundo da revolução industrial e cultural, se apresentava para os artistas que se envolveriam cada vez mais com as coisas de seu tempo, tanto retratando, quanto fazendo uso ou questionando este mundo que emergia.
Figura 1

            Naquela era de mudanças tão marcantes, tivemos no ano de 1889 em Paris a Exposição Universal, para qual os franceses inauguram a Torre Eiffel como grande marco da cidade para mostra, que se tornou a mais alta estrutura construída pelo Homem até então. Concebida também com a ideia de homenagear o centenário da Revolução Francesa e com o intuito de demonstrar a capacidade técnica de criar e construir da era moderna a obra que havia sido projetada para ser demolida em poucos anos acabou sobrevivendo para abrigar antenas de rádio, outra maravilha da tecnologia do final do século XIX.
            A obra, imaginada pelo engenheiro e designer Gustave Eiffel construído em uma era de plena revolução cultural, acabou por se tornar o principal símbolo de Paris, cidade centro da cultura, que, já há muito tempo criava e recebia tudo o que havia de novo. Para lá convergia artistas, escritores e pensadores de todas as partes.
            A Torre de Eiffel, pode ser considerado um selo para finalizar o século que abrigou o avanço maior da Revolução Industrial. Com esta revolução que levou a novos métodos de criar e realizar. A torre é um exemplo nítido deste processo. Processo este que se inicia com o desenvolvimento de outra arte que se firmava com a crescente industrialização: o design.
A revolução industrial teve profundo impacto no design; e este impacto foi de mão dupla, pois se de um lado o design levava facilidades ao processo fabril, por outro os processos em si levaram desenvolvimento a esta arte e aos designers; foi a partir deste que máquinas e suas partes e objetos foram padronizados. Além do padrão, tanto nos produtos, quanto nos métodos de produzir levou ao aumento cada vez maior da produção e com isto todas as consequências positiva e negativas que vem deste processo.
A produção e a padronização levaram ao aumento da oferta de produtos que exigiam consumo; aqui também uma via mão de dupla.
Se Monet, Renoir e Pissarro algumas décadas antes da virada para o novo século já se ocupavam com novos processos de vida, é certo que os artistas que se seguiram aprofundaram estas questões. No final do século XIX e início do XX tivemos muitos artistas que captaram este momento e levaram à sua obra, seja como forma estética, ou como forma de reflexão as conquistas do mundo novo. Produtos de designer acabaram por até mesmo se tornarem obras de arte.
Além da fotografia e do cinema, que iniciava sua caminhada que o levaria a se transformar na arte mais popular do século, as artes tradicionais captariam e registrariam as novidades a seu modo; indo até ao ponto de se recriar.
Figura 2
Elemento Mecânico, 1924
Fernand Léger
Fernand Léger é um artista que captou em sua obra a nova fase da Humanidade. Fosse por produzir uma obra que caracterizava o que poderia se chamar de moderno, seja por criar obras, em seu cubismo bem peculiar, que traziam representações de máquinas que  mais se aproximam da abstração; a obra Elemento mecânico de 1924 (figura 2) retrata este lado do artista. Léger, após a primeira guerra, na qual lutou, foi influenciado pelas máquinas utilizadas nas batalhas, fossem carros ou tanques, e levaria à sua obra, após o término das lutas, estas influências referente à tecnologia mecânica. O artista também se embrenhou na nova arte, o cinema, e dirigiu o filme Ballet Mecânico (1924). O título do filme que mostra o fascínio do artista pela modernidade é uma obra de caráter surrealista, embora Léger, com suas pinturas, não tenha sido considerado um exemplo deste estilo.
O cinema também foi pesquisa de Duchamp que realizou em 1926 o filme Anemic Cinema. Porém, Duchamp, anos antes já havia se destacado por outra via, pois vem na outra mão e traz para a arte novos elementos, tornando o urinol, um aparelho impensado como produto de arte, célebre ao levá-lo do design moderno a uma exposição onde questionava o próprio sentido de arte. A Fonte (1917), obra ícone que deu origem ao que o artista denominaria Ready Made, eleva o diálogo iniciado pelo dadaísmo a outras questões. Surge a partir de então uma nova forma de ver a própria arte. Certo que o urinol é um produto do design, mas a ideia de Duchamp abria um campo sem limites; assim décadas depois da Fonte, Nelson Leirner expõe no 4º Salão Nacional de Brasília a obra O Porco (1967) – um porco empalhado dentro de um engradado.
Mas antes mesmo de A Fonte, Duchamp já utilizara outros objetos em suas obras, como em A Roda de Bicicleta (1917) (imagem 3) e Porta Garrafas (1916). Design novos para funcionalidades em nova apresentação, como objeto de ver.
Imagem 3

A Roda de Bicicleta , 1917
Marcel Duchamp

Outro artista que busca pela inquietação do mundo moderno é Francis Picabia, que navegou entre o cubismo, dadaísmo e surrealismo. Ajudou a fundar o dadaísmo no EUA Editou revista em Barcelona sobre o movimento Dadá.
Assim como Léger, Picabia interessou pelos novos sistemas mecânicos, mas que poderiam ser ditos antimáquinas, como engrenagens que retratou em várias obras, que  como exemplo pode se citar Machine Turn Quickly, 1916-1918 (imagem 4).

Imagem 4
Machine Turn Quickly, 1916-1918
Francis Picabia

Man Ray, americano que se associa ao movimento surrealista, além da fotografia que o evidencia pelas experiências com esta arte, também produziu filme (L'Étoile de Mer – 1928). Este ciclo de artistas, sobretudo os surrealistas, foram fundamentais para o surgimento da arte contemporânea apontando infinitas possibilidades.
A partir destes processos e visões, onde tudo é possível surge Kurt Schwitters, que passa a fazer colagens utilizando tudo o que encontra. Schwitters começa em 1923 um grande projeto em sua própria casa, que chama de Merzbau (Casa Merz) (imagem 5) que consiste em ir fazendo todo tipo de intervenções ocupando todo o espaço. Fazendo colagens ou colocando objetos nos espaços possíveis a obra vai crescendo como um ser orgânico, que jamais será terminado. O projeto do artista foi inspiração para o sentido de instalação como arte. Durante a segunda guerra a casa de Schwitters foi destruída.
Sejam explorando novas técnicas ou utilizando os novos meios, a arte se reinventou tanto por assimilar a tecnologia nascente ou por questionar os novos meio de vida. Dos tempos em que os impressionistas começaram a captar o mundo moderno aos tempos em que se começava a revolucionar a própria modernidade com os surrealistas e dadaístas os artistas mantiveram forte diálogo com a tecnologia.
Acostumados a trabalhar com as sensações e sentimentos os novos artistas passaram a pensar uma nova cultura. Um passo enorme se deu desde o iniciou com Pissarro mirando as fábricas ao invés da frugalidade ao tempo em que Léger, Duchamp, Picabia e Man Ray, entre outros, olham para tudo e a tudo vêem como arte ou como não arte em um questionamento amplo sobre o novo mundo e a nova cultura. No início do século, Kurt Schwitters, mais que qualquer outro artista, tenta olhar para dentro de si mesmo e produzir uma obra que antes de representar um novo mundo, talvez seja a representa dele mesmo na busca por se encontrar e se reconstruir.
Imagem 5
Merzbau (detalhe) – 1923 - 1943
Kurt Schwitters

A arte da virada do século apontava para uma nova forma que ultrapassaria em muito as tradições; além das novas técnicas e de um mundo em constante transformação que levou a Humanidade a novas questões, tais como pensar a arte e a própria vida. As inovações tecnológicas em todas as áreas, desde o design de sanitários ao tanque de guerra, passando pela fotografia e o cinema, tudo parece ter se tornado complexo, tornando complexo o próprio cotidiano, suscitando por isto novos questionamentos. Daí entender o insulamento de Kurt Schwitters e sua busca por se fechar e produzir algo que talvez fosse uma própria forma de autoentendimento ou quem sabe uma forma de se expressar e libertar a opressão que surge nas eras de profundas transformações; semelhante ao que vivemos hoje.



[1]     No ano de 1869 Monet (Banhista de Grenouillière), Renoir (La Grenouillière) e Pissarro (La Grenouillère em Bougival) produziram uma série de obra em uma localidade francesa chamada Grenouillière.

(AEM, 2016)