Embora a arte romana, sobretudo o retrato, tenha
sofrido influências de quatro correntes que, segundo Bianchi Bandinelli[1],
são os de ascendência médio-itálica, o retrato de ascendência patrícia, o
retrato helenístico e o retrato médio-itálico com influência helenística, há um
predomínio da influência grega, até porque como afirma Bandinelli há uma
corrente médio-itálica que também deriva do retrato grego; aliás, este é mais
um capítulo da forte presença da cultura grega sobre a romana. Mesmo no período
republicano quando se desenvolveu o retrato patrício, este era feito por artistas
de educação grega[2].
O retrato realista somente surgiu entre os etruscos
e na média Itália após já estar consolidado na Grécia, ou seja, isto também é
mais um fator que demonstra que os gregos estão mais evoluídos que os demais
povos da península italiana.
E desta mistura com predomínio grego, principalmente
do realismo, surgirá como uma variante deste, o retrato de identidade romana, a
partir do período da ditadura de Silas (82-79 aC).
O inicio deste período pode ser identificado,
segundo Bandinelli, pelas moedas onde foi colocado o retrato de Júlio César
(100 – 44 aC), sendo este o primeiro a infringir a lei que não consentia que
fossem colocadas imagens de pessoas vivas em moedas[3].
Posteriormente Otavio foi autorizado pelo senado a fazer o mesmo.
Nesta época a província da Ásia Menor estava sob
forte crise e seus artífices emigraram para Roma, a mais próspera cidade, e
certamente foram responsáveis pelos retratos realistas.
Característica do retrato romano
Bandinelli afirma que o retrato romano caracteriza,
sobretudo pelo minucioso realismo, que ama descrever as minúcias das
epidermes, quase como se se tratasse de um relevo geográfico[4].
Neste contexto Jocelyn M. C. Toynbee escreve em A Arte dos Romanos que
floresceu cerca de 75-65, um grupo de retratos esculpidos em que o realismo
helenístico atingiu sob os auspícios romanos aquele máximo de desenvolvimento a
que tem aplicado a denominação de “verismo”.
As esculturas romanas, além do realismo, parecem ter
ainda a finalidade de elevar uma condição psicológica do retratado, onde são
exaltadas as características de castas, históricas, posição social e outras que
denotam que o retratado tem méritos superiores ao mundano, isto faz Bandinelli
expressar: O retrato romano do século I a.C. não pode pois, absolutamente,
ser compreendido todo sob uma única etiqueta ou uma só definição. A base de uma pesquisa comum de realismo
tem um fundamento antes ideológico do que artístico...
O retrato romano é, antes
de tudo, uma forma de afirmação, de difusão pessoal, de perpetuação, seja nas
sendas da política, seja na doméstica, onde os patrícios cultuavam seus
antepassados e suas histórias, até como documento para avalizar a casa onde
estão expostas. O retrato realista esculpido satisfazia uma especial
necessidade psicológica e social[5].
Uma característica
importante se verificou nas esculturas de Augusto em que há uma mescla entre
o idealismo helênico e a individualização das feições[6]. Ou seja, era a busca das feições e
características próprias do imperador com o ideal criado na arte, na filosofia
e nos mitos gregos. Mais uma vez se verifica a influência da cultura grega
sobre a romana.
Relações
do retrato romano com o retrato grego.
Os gregos esculpiram seus retratos com o intuito
político-social, diferente dos romanos que levaram, além da esfera pública,
para a vida provada. Este retrato romano, que penetrou por todas as os âmbitos
patrícios, como já visto acima, é uma variação do retrato grego, da qual sofreu
forte influência. Na escultura uma das marcas que se desenvolveu em Roma foi o
surgimento dos bustos, algo não admitido entre os gregos que apenas concebiam
suas obras de corpo inteiro, sem “mutilações”.
Outra diferença foi a arte do retrato ser levada ao
máximo do realismo em Roma, embora estes tenham sido iniciados com artistas
grego, sobretudo após o fim da república romana; mas conceber minúcias de
grande realismo é um legado vindo do médio-itálico-helenístico.
Diferentemente dos gregos, os romanos sofreram
várias influencias, e desenvolveram suas obras em uma mescla destas, embora a
arte grega, tanto pelas obras conhecidas e apreciadas pelos romanos, tanto
pelos artistas que emigraram para Roma, ajudou a moldar a arte romana com mais
intensidade, sendo esta como uma herdeira daquela, levando, contudo a arte da
escultura a um classicismo refinado e plástico[7].
A nudez, marca das esculturas gregas não foi seguida
em Roma que produziu os retratos com os trajes que definiam também a condição
político-social do retratado. Assim como as couraças dos soldados como afirma
Plínio, embora este, segundo Bandinelli[8],
cometesse um anacronismo quando tratou do assunto, mas não se pode negar que a
arte romana seguiu este conceito.
Relação do retrato com a política, sociedade e cultura
O retrato na sociedade romana teve um papel
importante pois, acima de tudo, foi um veículo de propagação e de “eternização”
de imperadores, cônsules, senadores e de demais patrícios ricos e influentes.
A própria dimensão que tomou a questão do retrato
para os romanos já nos dá uma noção de suas condições, pois este legado diz,
mesmo para nós, a força daquela sociedade que se desenvolveu e que dominou o
mundo conhecido à época. Isto colocado em seu próprio tempo ante seus inimigos
faz parecer algo grandioso e que deve ser admirado e temido. Estátuas e moedas
romanas com imagens de seus imperadores, divinizados, que somados pelo ideal
helenístico com o realismo romano em suas efígies davam a medida de seu poder de
penetração em todo império.
Mas o retrato tinha também um caráter doméstico no
culto familiar. Uma casa decorada com estátuas onde se representam os
antepassados mostrava uma família de tradição; uma família “venerável”. Entre
as famílias ricas os mortos tinhas suas tumbas decoradas com seus retratos.
O retrato tinha ainda o intuito de mostrar, através
dos detalhes quem era o retratado: vestes, penteado, modo de se representar
dizia muito da personalidade e a origem, mesmo não se sabendo quem era de fato
o(a) retratado(a).
Conclusão
A arte do retrato em Roma foi muito desenvolvida, até
pela mescla de influências que, embora a arte grega tenha sido a mais marcante.
Mas tem-se que dar ênfase a influencia médio-itálica pela forma realista dos
retratos, sobretudo a partir da era de Júlio César, o que deu a este a
possibilidade de fazer produzir moedas com sua imagem.
Através da história foi comum em todos os povos produzir
arte como monumento e documento dos reis e imperadores de forma a se firmar em
uma natureza superior ante os súditos. Mas entre os romanos este estratagema
foi levado à perfeição com seus imperadores e governadores sendo representado
em majestade e detalhes pelos artistas.
Mas como Roma se tornou uma cidade muito poderosa e rica,
este privilégio não ficou apenas com os imperadores, tendo seus mais nobres
cidadãos também desfrutado desta aura de endeusamento e sobrevida, sendo alguns
deles chegados até nosso tempo.
Fator importante a salientar é que este interesse romano
pela arte e cultura grega foi importante para que se mantivesse viva a arte
clássica helena, até pelas muitas cópias feitas pelos romanos das estatuas
gregas. Enfim, sejam produzidas por artistas gregos ou romanos a arte
grego-romana foi a base da arte ocidental, sendo esta a fonte para o
Renascimento na Idade Média, que se desenvolveu sobre seus pilares, onde se
mesclou em princípio o paganismo e o cristianismo, até a influencia dos mitos
perderem sua força pela ação da igreja, mas a essência da arte se mantém viva e
vibrante desde aqueles dias de Silas, Júlio César e Augusto até o hoje.
[1] Bandinelli, Ranuccio B. - O
relevo honorífico e o retrato.
[2] Bandinelli, Ranuccio B. – Idem
[3] Bandinelli, Ranuccio B. – Ibid
[4] Bandinelli, Ranuccio B. – Ibid
[5] Toynbee,
Jocelyn M. C. – A arte dos romanos
[6] Toynbee, Jocelyn M. C – Idem
[8] Bandinelli, Ranuccio B. – Ibid página 1
(AEM, 2015)
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